15/07/2009
Robótica, por Benedicto Franco Jr.
1. Você nos convidou para participar da Maker Faire, e alguns "novatos" ficaram
completamente contagiados com a intensidade do mercado de Robótica e Automação, poderia comentar
um pouco sobre esta onda?
A Maker Faire é um evento único, é o paraíso de todo "geek" mas que ao mesmo tempo surpreende ao
expor a efervescência da eletrônica com um invólucro democratizado. O que quero dizer com isso é
que a eletrônica por assim dizer, está sendo remodelada e atraindo pessoas com conhecimento mínimo
nessa área. Ao meu ver, a disponibilidade de módulos prontos que resolvem problemas complexos e
toda a reorganização dessa indústria ao promover seus produtos através de kits de desenvolvimento,
serviços e incentivos ao curioso e ao inventor caseiro, está frutificando e se popularizando,
trazendo consequentemente inovação a um nicho que foi deixado um tanto de lado pelo hobista a
partir dos anos 90, quando os computadores pessoais ficaram mais acessíveis ao grande público e a
internet se tornando o foco de todos.
2. Nós desenvolvedores estamos acostumados com o conceito de Software Open Source e agora estamos sendo
apresentados ao Hardware Open Source, o que significa isto? Quais os impactos no produto final?
A minha interpretação para "hardware open source" é imprecisa, não consigo ter uma definição clara do
termo. Vejo que esse movimento é mais um apelo ao sucesso que projetos de software "open source"
obtiveram. É um empréstimo, uma forma de chamar a atenção, na minha talvez injusta opinião.
Pode parecer estranho mas todo projeto de hardware, por mais trivial que seja, é por vezes muito mais
"open source" do que se pensa. É relativamente fácil encontrar o diagrama eletrônico completo
de vários aparelhos eletrônicos como TV, aparelhos de som e mesmo de computadores. Em tempo, estou
assumindo que o análogo ao "source code" de um software é o diagrama eletrônico de um hardware.
Para ilustrar melhor, o Steve Wozniak, um dos fundadores da Apple e o criador do Apple II, quando jovem,
tinha o hobby de passar o fim-de-semana na biblioteca da universidade de Stanford, simplificando
projetos de computadores contemporâneos da época. Um outro exemplo é o IBM-PC original, que foi
revolucionário e obteve grande adesão da indústria porque sua arquitetura foi aberta para quem
quisesse desenvolver novos periféricos. Estes são alguns poucos exemplos de "hardware open souce"
que estão por ai há anos! O diferencial é que, com toda essa infraestrutura que hoje o hobista tem ao
seu dispor, é possível construir muito do que se imagina a um custo razoável, com qualidade, mesmo não
sendo em grande escala.
Além do Arduino (http://www.arduino.cc/),
um outro exemplo interessante de "hardware open source"
é o "Chumby"
(http://www.chumby.com/developers),
que vai muito além da nossa tradicional visão de um despertador.
3. Quais os pontos altos da Maker Faire ? Ou o que havia de mais interessante?
O ponto alto da Maker Fair é a comunhão entre arte, artesanato e tecnologia, numa
vertente que beira a barganha. Apesar de estar inserida e ser promovida por empresas,
nesse evento muitos desconhecidos, que por opção ou por uma parcial inocência
capitalista, expõem ao público seus trabalhos de uma forma participativa e
detalhista, em um verdadeiro culto ao intercâmbio de conhecimento.
Concretamente falando, fica a percepção acentuada de que muito do que se vê ali é
o uso da tecnologia de uma maneira inusitada e inovadora, em interpretações com
perspectivas que encantam, sensibilizam ou simplesmente divertem, resultando
instantes que nos remetem a planos divergentes dos triviais aos que nos deixamos
levar. Por exemplo, muitos de nós temos em casa uma bicicleta e possivelmente um
celular de última geração, mas poucos vislumbram que a união do tradicional com
um ícone de tecnologia poderia nos oferecer uma nova dimensão.
Veja:
Por tudo isso, é árdua a tarefa de elencar os destaques da Maker Faire (para se ter uma
pitada desse evento, vale a pena ver este vídeo. Lá você é sempre surpreendido ao visitar qualquer expositor.
Posso dizer que particularmente me atraíram objetos que representavam uma simplificação
extrema de equipamentos consagrados. A exemplo disso, vimos um "plotter" montado
verticalmente em uma plataforma de madeira em formado de ´T´, tendo nas
extremidades superiores, motores de passos que movimentavam uma caneta através de cordões de Nylon.
4. Sabemos que você também gosta de participar do clube de inventores e tem interesse neste
assunto. Quais as invenções mais incríveis que você viu morando aí nos Estados Unidos?
Não é bem um clube de inventores, pode-se dizer que é uma oficina de aluguel. É um espaço
onde se tem acesso a uma infinidade de ferramentas e maquinaria disponível para construir o
que se desejar. Obviamente é um lugar onde o encontro de pessoas criativas é favorecido
através de cursos e eventos. Para se ter uma ideia de como a
TechShop é bem equipada, lá se tem
acesso a ferramentas simples como furadeiras e máquinas de costura, até ferramental
pesado como prensas, tornos, cortador de metal por plasma e etc. Um dos equipamentos
mais impressionantes é um "plotter" tridimensional, capaz de confeccionar
peças em plástico a partir de um modelo criado em um CAD.
Sobre invenções aqui nos EUA, o que muitos chamam de invenção, na maioria das vezes
vejo como aprimoramento. Não estou querendo desmerecer o esforço, investimentos e toda a
pesquisa exigida para que se obtenha algo melhor e mais eficiente. Uma pura invenção nem
sempre tem qualquer atrativo ou um obvio papel funcional, já que na sua grande maioria,
a criação está além da necessidade ou compreensão humana de seu tempo. Entretanto, quando
se consegue um invento que agregue todas essas características, o objeto se torna um
sucesso. Posso destacar algo que talvez não seja tão recente assim mas que me atrai
por sua engenharia e funcionalidade:
a caneta Pulse.
5. Conhecemos a fama da mesa de pebolim disponível na Yahoo em Montain View!
(E também da sua prática diária deste esporte!). Poderia nos contar um pouco mais
sobre a mesa de pebolim que você está desenvolvendo?
Antes de mais nada, tenho que fazer duas correções. O "head quarter" do Yahoo! é em
Sunnyvale/Califórnia e não em Mountain View. A segunda, bem, a prática de pebolim não é
tão diária assim! Talvez esta seja a motivação original para justificar o que estou desenvolvendo.
Ao chegar aos EUA, percebi que não era fácil achar parceiros para uma partida de pebolim no
meio da tarde, ao parar para tomar café. Essa frustração me fez achar que seria interessante
ter uma máquina como adversário. Pensando um pouco e trocando ideias com o Paulo Carlos,
chegamos a uma solução relativamente simples para controlar os eixos da mesa de pebolim através
de motores de passo e uma câmera, comandados por um computador. Isto ainda é um projeto em
andamento mas parte dos acionadores já foram testados, faltando agora o software. Um dos
componentes em desenvolvimento é o de reconhecimento de imagem, que deverá fornecer a posição
da bola dentro do campo. Além desse, falta ainda o que é obviamente o mais interessante, a
implementação do algoritmo de ataque e defesa.
Pouco tempo depois de ter iniciado a construção deste brinquedo, encontrei, em pesquisas
pela Internet, uma universidade na Alemanha que já havia desenvolvido algo bem similar
em seu departamento de IA (inteligência artificial).
Neste vídeo pode-se ter uma idéia do que eles desenvolveram.
6. Quais as linguagens de programação mais utilizadas neste mundo?
Boa parte dos kits de desenvolvimento oferecem suporte para a linguagem C/C++.
Em alguns poucos casos, conhecimento de "assembly" também se torna necessário. Me
lembro de um problema que enfrentei com a
"TINI board"
que oferece um ambiente de desenvolvimento todo em Java. O projeto no
qual eu estava participando tinha que controlar outros periféricos conectados em um
barramento RS-485.
Tal barramento tem sinalizações digitais cuja temporização afinada entre o hardware e o
software se torna crucial na transmissão de dados. A implantação do Java naquele ambiente
não respondia adequadamente aos eventos "real-time" e tive que interfaciar a aplicação em
Java com um módulo nativo em linguagem de máquina para poder capturar os dados sem perdas.
Respondendo a sua pergunta, eu colocaria em ordem de importância: C/C++, Java/J2ME, Assembly
(do 8051 e variações, ARM e PIC) e algumas outras linguagens proprietárias, dependendo da
plataforma.
7. É essencial saber um pouco sobre eletrônica?
Todo conhecimento ajuda mas o fundamental é poder contar com pessoas de perfis
complementares aos seus. Poucos projetos hoje podem ser bem executados por uma única
pessoa. Conseguir apoio e amigos com quem se possa discutir as ideias no intuito de
torná-las mais sólidas, é por muitas vezes mais crítico para o sucesso do que se ter
um conhecimento aprofundado em um assunto.
Eletrônica é um campo vasto. Mesmo para quem tem um profundo conhecimento de lógica,
o transporte disso para a eletrônica digital reserva algumas surpresas, caso não se
tenha um conhecimento básico.
Montagens de kits ou a criação de algo utilizando-se apenas módulos projetados para
funcionarem especificamente um com o outro, é factível para um leigo que seja
cuidadoso e que siga as instruções de montagem adequadamente. Mas a partir do
ponto onde se quer conectar coisas não previstas como por exemplo um simples
motor ou mesmo um LED a uma saída digital, o mínimo de conhecimento de eletrônica
analógica é necessário.
8. Temos visto muitas aplicações diferentes e engraçadas mas como este conhecimento
pode ser utilizado na prática para melhorar ou simplificar processos da nossa vida
cotidiana?
A automação e segurança residencial é aparentemente uns dos primeiros desafios que
motiva uma grande parcela de hobistas que invejam a casa dos "Jetsons".
Alguns desses ideais estão mais próximos. Hoje, com a facilidade que se tem de
construir aparelhos conectáveis em rede, há o favorecimento à coleta de dados
que antes estariam confinados. Há projetos que monitoram a sua casa enviando
ao Twitter (http://twitter.com/andy_house)
todo e qualquer evento relevante.
A linha de robôs para limpeza iRobot é também uma plataforma de desenvolvimento para o
hobista que quer trazer para mais perto os benefícios da robótica ao seu lar.
Esta é apenas uma das muitas áreas onde existem inúmeras possibilidades a serem exploradas!